segunda-feira, 16 de julho de 2012

...em suspenso...


Anos, anos antes do Matrix, um dos meus (inúmeros) sonhos recorrentes era o salto em slow motion e em altura. Não era sobre voar, era sobre pular mas em câmara lenta. Só ouvia o stomp que os meus pés faziam ao bater no chão e depois o vuuuush do ar deslocado por mim a escorrer pelos ouvidos. Nunca falava com ninguém nem via nada de especial a acontecer que me impelisse para a fuga. Era só fechar os olhos, adormecer, e….vuuuush. O sonho era “apenas” isso: parava num cenário, levava o meu tempo a ver o que me interessasse e seguia para outro cenário, era isso: sem conversas, nem perceções de estados de alma, sem visões iluminadas, sem conclusões nirvanianas…

Na literatura - vastíssima - que se debruça sobre a interpretação de sonhos (fiz questão de consultar algumas publicações, sempre cética em relação a tanta coisa gosto de manter-me informada, no lo credo, pero…) diz-se que podemos imputar este tipo de sonhos a estados de ansiedade. Puf, nada disso, pelo menos comigo…ou será uma forma inteligente de inconscientemente lidarmos com isso e depois acharmos que resolvemos mesmo bem as etapas da nossa vida?! Adiante…

A ansiedade é uma coisa muito mostrenga. Para umas coisas insinua-se com acelerações de batimentos cardíacos, estoura nos ouvidos e atira-nos para as situações quer queiramos quer não e logo se vê… Noutras ocasiões assombra o subconsciente e já não lidamos tão fisicamente com ela, sonhamos e a psique que resolva… e casos há em que a sentimos segundo a segundo sem parar e sem passar…não passa…uma notícia (má) que nos chega de uma forma que não nos permite lidar com ela na hora, despoleta o estado de ansiedade -  alguém que sofre longe de mim, que quero abraçar e não consigo por estar fisicamente longe, começa a apertar-me lentamente as têmporas. O abraço fica adiado, por força das circunstâncias, adiado para daqui a pouco tempo mas mesmo assim o tempo urge e a ansiedade que não passa…as ansiedades não são de todo iguais, esta é dor incessante, é incessante porque nos deixa funcionar e até interagir, produzir e socializar, amar…mas está com os dentes férreos cravados na carne, é carraça e suga. Deixa-nos como os heróis nos jogos de plataformas: andamos mas vamos vendo o “stamina” a descer…

Vuuuush…fecho os olhos e, num pulo estarei aí…esta ansiedade, só a aplacarei num abraço apertado a sentir o teu coração bater encostado ao meu e, aí o pulsar das têmporas dar-me-á tréguas…

(dedico estes pensamentos à minha Amiga L)

terça-feira, 3 de julho de 2012

Tempo da Vaca Santa (-ignorância)


Anda tudo em alvoroço, os “indignados” na rua, os incrédulos na ponta de um microfone, o povo todo surpreendido com o que se “oferece” como retribuição por serviço prestado ou o infindável rol de tarefas que se espera que o outro seja capaz de desempenhar a troco de pouco mais que o salário mínimo…Uma breve passagem de olhos pelos jornais ou uma visita a alguns sites de emprego bastam para a teoria ser facto.

Enquanto país futebolisticamente orgulhoso e de punho cerrado batendo no peito somos grandes, agora no que toca a defendermos a nossa dignidade somos minúsculos.
O aumento dos bens podia ser “um bocadinho menos...assim 5%. Os 7% é assim, muito…”. Dizem-nos que podemos vir a sofrer cortes de 100 euros, aumentos de 10% e dias depois os cortes afinal são de 70 euros e os aumentos de 7% e então aliviadinhos dizemos “Ufa, podia ter sido pior!” (?!), como “pior”? Será que não passa pelas cabeças destas criaturas que o plano está de antemão traçado? Que era ridículo avançar-se com valores para dias depois serem corrigidos? Não é exequível num planeamento orçamental atirar-se um número ou valor percentual para na mesma semana (e já perto do fim de semana para ajudar ao descanso e à absorção de informação) ser feito um “ah afinal não será tanto”. A estratégia funciona sempre. Achamos sempre que há alguém que realmente se preocupa e conformados enterramo-nos um pouco mais no sofá da quietude e subserviência. Comemos e calamos, ligamos e desligamos na hora de sair de casa e regressar, switch on: tarefas cumpridas, switch off: empacotamento televisivo, chichi e cama, no in between, até se ouvem os grilos a cri-cricar!

No tempo das vacas que-deviam-ter-espelhos-daqueles-que-distorcem-pois-achavam-se-gordas-e-via-se-que-aquilo-era-chão-que-ia-dar-em-magreza, era o florescer de cursos privados para profissões que iam oferecer mais que a procura. Ganâncias que se esqueceram de criar um grupo sindicalizado forte e acabaram por entregar os seus profissionais às mãos de empresas que gerem os tetos salariais e agora, a título de exemplo, temos enfermeiros que depois de um curso muitíssimo exigente têm que “contentar-se” com pouco mais de €300/mês. Podem não calar-se (vêm aí os protestos e ações de rua) mas vão comer porque são muitos, não se preveniram como os médicos (que mantiveram o limite de vagas e viraram a cara ao privado) e agora têm empresas externas a lapidar salários. É o desbarato à pior oferta.

Mas agora, a sério: vou juntar os 3% de diferença que “ganhei” com a correção e passar da meia ao collant a ver se o meu pé fica decente.